O que é burlesco e de onde veio a arte da burla?
- Petit Cappuccine
- 20 de ago. de 2024
- 4 min de leitura
Atualizado: 21 de ago. de 2024
Provavelmente, se você chegou a esse artigo, o burlesco adentrou sorrateiro ao seu ouvido. A partir daí, a pergunta “mas o que é burlesco?” começou a rondar seu imaginário. Será que tem a ver com Broadway? Será que é algo relacionado ao filme-musical da Christina Aguilera? É uma dança?
Nesse artigo vou trazer algumas definições do que é burlesco, baseada em alguns artigos e trabalhos já publicados, além da minha visão dessa arte ainda tão pouco conhecida.
O que é Burlesco, afinal?
Dança burlesca? Teatro? Entendo o burlesco como uma arte performática que combina comédia, sensualidade e paródia. Em grande maioria, a performance conta uma história através do desnudar do corpo, que pode vir através de uma dança ou da teatralização dos movimentos e expressões.

O deboche é um elemento fundamental no jogo de superexagerar o que está sendo contado de um jeito divertido e sensual. Envolve contexto, estilo, intenção e interação com o público. Mas será que você sabe de onde vem o burlesco?
Um pouco de história
O termo burlesco foi usado pela primeira vez na literatura, no século XVII, na França, para designar obras que tratavam de maneira vulgar hábitos da nobreza, ou vice-versa.
Entrou no teatro carregando esse tom da literatura, através de peças clandestinas e marginais que faziam burla de nobres personagens, ou enobreciam personagens populares no intuito de causar graça.
Influenciou todo o tipo de teatro popular na Europa e América, incluindo o vaudeville, o teatro de variedades e o teatro de revista – este, muito disseminado no Brasil.
O burlesco espalhou-se por vários países, por volta do século XIX, tanto para o Brasil (especialmente nas revistas), quanto para os Estados Unidos (em vaudevilles e teatro de variedades).
Nos EUA foi muito disseminado em Nova York e Chicago, conquistando plateias de trabalhadores braçais pela ousadia de seus espetáculos onde as atrizes mostravam as canelas, usavam decotes, vestiam-se de homem, contavam piadas sujas e mexiam com a plateia.
Um trabalho realizado principalmente por mulheres, que utilizavam mais livremente seus corpos, com uma finalidade política: a afirmação de valores próprios, baseados na crítica à não participação feminina na sociedade.
Mas não pense que era um trabalho valorizado e glamouroso. Na maioria dos casos foi marginalizado, marcado por apropriações de outras culturas e exotificação também. Esse é seu grande paradoxo, entre a autonomia e a objetificação.
O burlesco viveu seu auge dos anos 20 aos anos 50, com a maior presença do tease - provocar mais que mostrar. Na década de 60, perdendo espaço para o erotismo explícito praticamente desapareceu.
Tem seu retorno na década de 90, com o chamado Neoburlesco, com maior força no underground de Nova York, mas há indícios de aparições em outros lugares como Los Angeles também.
Nomes como Julie Atlaz Muz, Tigger, Miss Indigo Blue e Dirty Martini são alguns nomes desse ressurgimento em Nova York. E como mostra o documentário SHAKEDOWN, dirigido por Leilah Weinraub, na mesma época Egypt Blaque Knyle fazia o mesmo movimento nos strip clubs lésbicos e voltados para o público negro em Los Angeles.
É a partir desse ressurgimento e das características atribuídas nele, que enxergamos o burlesco que temos hoje.
Strip-tease e burlesco: Qual a relação entre eles?
O strip-tease foi aderido e tem várias aparições diferentes. Inicialmente sendo um nu estático, fazendo referência ao estatuário grego, vai ganhando movimento por “descuido” ou “acidente”, mas que mexeu fortemente com o público da época.
Mirela Silva Perez traz algumas dessas aparições em seu trabalho de mestrado, A Semiótica do Burlesco, citando trechos do livro Eros e Burlesque de Julie Vesper:
A Bailarina Mae Dix que, terminado seu número no restaurante dos irmãos Minsky em Nova York, começa a despir-se despretensiosamente, levando o público à loucura e resultando na proposta do diretor para que ela repetisse o “acidente” nas próximas apresentações. Outra aparição acidental foi quando Hinda Wassau perde o sutiã devido a um acidente em um local de Chicago durante uma série de travessuras, ou pelo menos assim diz.”
Independente de como se estabeleceu seu início, o strip-tease é uma característica indissociável do burlesco. Foi inclusive, elemento crucial na burla em muitas épocas, como na proibição da nudez dos mamilos.
Assim surgiu o pastie, ou tapa-mamilo tão característico – em resposta a uma proibição, não só não deixaram de ter destaque como chamam mais atenção para tal, agora rodando os tassels.

Como é um show de burlesco?
Quem acha que vai num show de burlesco para ver corpos nus e somente, com certeza será pego de surpresa. Sim, porque quem vai com esse intuito se depara com diversos conteúdos políticos e críticas sociais ao longo do espetáculo.
Para Kaitlyn Regehr, a performance oferece a oportunidade de criar ideias e burlar o que ela chama de esquemas culturais fixos ao redor do sexo. Concordo, mas eu iria além do sexo aqui.
Miss G, em a Burla do Corpo, traz o conceito de subversão de normas e padrões sociais impostos ao corpo, independente de qual ele seja. O burlesco entra como uma ferramenta de liberdade desse corpo.

Através da performance, você é capaz de trazer ao palco os assuntos que atravessam o seu dia a dia, fazer graça disso, satirizar e abrir reflexões a respeito do tema na cabeça da pessoa que está assistindo.
O ato acontece a partir do jogo entre o performer e a plateia, que ao criarem conexão, dialogam. Não existe “quarta parede”. Para uma peça do figurino ser retirada, desnudando mais uma etapa do que está sendo contado, é necessário gritos intensos da plateia em cumplicidade com o performer.
Mas não se engane, o performer não está subordinado aos desejos e anseios da audiência. Muito pelo contrário. A quebra da expectativa, misturada a um tanto de absurdo, é o que dá o gostinho a mais. Tirando a plateia do lugar comum e transportando pra surpresa e para o inesperado.
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